Por Renan Dantas / 29 dez 2023, 16:28 - atualizado em 29 dez 2023, 16:28
O ano começou com uma das maiores fraudes financeiras da história do mercado de capitais do Brasil. No dia 11 de janeiro, por volta das 19h, a Americanas (AMER3), uma das maiores e mais tradicionais varejistas do país, anunciou que havia descoberto um rombo de R$ 20 bilhões, mais do que o tripo do seu valor de mercado, à época em R$ 6 bilhões.
Em poucas semanas, a empresa foi obrigada a pedir recuperação judicial para se proteger da cobrança dos bancos, os maiores credores da companhia. O que se viu depois do caso foram outras grandes empresas solicitando proteção na justiça.
De acordo com o Serasa, até outubro, 1108 companhias entraram em recuperação judicial. O número dificilmente passará o pico, registrado em 2016, auge da crise financeiro do governo Dilma Rousseff e quando 1863 companhias pediram proteção. Porém, a cifra em 2023 é a maior dos últimos cinco anos.
“Depois de um período de queda e estabilização, estamos vendo número crescente, inclusive mês a mês e cada vez empresas maiores. Essa é a grande novidades, temos presença maior de grandes e médias empresas”, destaca Max Mustrangi, sócio fundador da Excellance, empresa que atua na reestruturação de empresas.
Para ele, há algo em comum que une todas as empresas: a má gestão.
“Sistemas de incentivos errados, estratégia de crescimento a qualquer custo. Na época do dinheiro barato [quando a Selic chegou a 2%], tomou-se endividamento, alta alavancagem. Para comprar participação no mercado, derrubou a rentabilidade, o que exige ainda mais capital de giro”, coloca.
Na visão do especialista, as empresas continuam insistindo no mesmo erro, ou seja, incentivando o crescimento pelo crescimento, “o famoso faturamento por resultado operacional (Ebitda)”. “É a única coisa que o sistema financeiro busca”, completa.
Ainda segundo Mustrangi, a recuperação judicial foi banalizado no Brasil, não por culpa do instrumento em si, mas devido às empresas. “A culpa são dos gestores, acionistas, advogados. Esperam até o último momento para pedir recuperação judicial”, complementa.
Veja a seguir as empresas que pediram recuperação judicial.
Americanas
Data do pedido: 19 de janeiro
Dívidas declaradas: R$ 43 bilhões
Semanas após anunciar o rombo financeiro, a Americanas entrou com pedido de recuperação em uma medida desesperada para se resguardar dos bancos, que buscavam reaver seus débitos.
No documento, a Americanas afirmava que alguns credores, “sem qualquer embasamento contratual ou legal, já haviam declarado o vencimento antecipado das obrigações da companhia”.
E na semana passada, depois de muitos imbróglios e disputas, os bancos e a varejista chegaram em acordo, que inclui uma injeção de R$ 12 bilhões pelo trio de bilionário Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, além de R$ 12 bilhões em conversão de dívida em ações da empresa.
Oi
Data do pedido: 2 de março
Dívidas declaradas: R$ 29 bilhões
Três meses depois de anunciar o fim da sua recuperação judicial, a Oi (OIBR3) retornou a Justiça para pedir, novamente, proteção contra credores.
Na época em que saiu da RJ, em dezembro, a companhia estimava que ainda tinha uma dívida de R$ 6,9 bilhões, mas que seria capaz de gerir seus débitos pelos próximos 3 anos, o que não aconteceu.
Segundo a Oi, o ajuizamento do pedido de recuperação judicial foi um passo crítico na direção da reestruturação financeira e busca da sustentabilidade de longo prazo da companhia e de suas subsidiárias.
123 Milhas
Os problemas financeiros não são de agora e a 123 Milhas admitiu débitos de mais de R$ 2,3 bilhões.
Conforme o argumento levantado na RJ, a agência tinha apostado na queda dos valores das passagens aéreas após a pandemia, levando ao acúmulo de dívidas para que pudessem honrar com as vendas já feitas.
Em comunicado, a agência de viagens pontuou que recuperação judicial procura assegurar o cumprimento dos compromissos assumidos com clientes, ex-colaboradores e fornecedores.
“A empresa avalia que, desta forma, chegará mais rápido a soluções com todos os credores para, progressivamente, reequilibrar sua situação financeira”, disse.
Starbucks Brasil
A empresa de private equity SouthRock Capital, operadora das marcas Starbucks e Subway no Brasil, entrou com pedido em novembro.
O documento elaborado pela TWK Advogados, no qual o Money Times teve acesso, tem 30 páginas e cita dívidas de R$ 1,8 bilhão.
O fundo de investimento focado no setor de alimentos e bebidas também é dono da operação do centro de gastronomia Eataly e do TGI Fridays no país.
A empresa, do investidor norte-americano Ken Pope, entrou com o pedido de RJ em São Paulo alegando que “é onde são realizadas as operações comerciais que geram a maior parte das receitas e onde estão situados os ativos mais relevantes”.
A SouthRock explica que solicitou a recuperação judicial para proteger financeiramente algumas de suas operações no Brasil atrelado a decisões estratégicas para ajustar seu modelo de negócio ao atual cenário econômico.
“Os ajustes incluem a revisão do número de lojas operantes, do calendário de aberturas, de alinhamentos com fornecedores e stakeholders, bem como de sua força de trabalho tal como está organizada atualmente”, reforça.
Petrópolis
Dona das marcas das cervejas Itaipava e Petra, a empresa apresentou à 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro um pedido de recuperação judicial de suas empresas. Também foram incluídos os braços do grupo que atuam na geração e comercialização de energia e no setor agropecuário.
Segundo O Globo, com dívidas de R$ 4,4 bilhões, o grupo cervejeiro apresentou ontem o pedido para evitar o vencimento de R$ 105 milhões de uma dívida que poderia provocar o vencimento antecipado de outras operações.
O Grupo Petrópolis afirma dever R$ 2 bilhões com obrigações financeiras e de mercados de capitais. As dívidas com terceiros somam R$ 2,2 bilhões.
Os advogados do Grupo Petrópolis afirmaram que a companhia está em crise há meses, assistindo à queda do volume de vendas desde 2021.
Houve uma forte redução na receita da cervejaria: de 31,2 milhões de hectolitros de bebida vendidos em 2020, o montante caiu para 26,4 milhões e 24,1 milhões de hectolitros em 2021 e 2022, respectivamente.
Bergamasco
O Grupo Bergamasco (Agropecuária Três Irmãos Bergamasco Ltda), que conta com terras ligadas ao fundo imobiliário BTG Terras Agrícolas (BTRA11), entrou com pedido de recuperação judicial em 30 de novembro.
A família de produtores rurais protocolou o pedido na 4ª Vara Cível de Sinop, com dívida superior a R$ 124 milhões.
Em agosto, o BTRA11 retomou a posse dos Imóveis 3 Irmãos do Grupo Bergamasco após distrato, assim como a recompra pelo Grupo Bergamasco da Fazenda Colibri por R$ 42,8 milhões, localizada em Nova Mutum (MT).
Em julho, o Grupo Bergamasco atrasou o pagamento da última parcela de compra da fazenda, o que resultou em um impacto negativo mensal de R$ 0,33 por cota do FII.
Colaboraram Flávia Pereira, Diana Cheng e Pasquale Augusto
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